Marianela Valverde apresentou em Vila Real de Santo António o livro «Os impactos da Ditadura nas Famílias dos Opositores Políticos», um trabalho que resgata memórias de familiares de presos políticos do Estado Novo e que é acompanhado por um filme sobre a mesma temática.
A sessão, integrada numa programação cultural mais vasta, sublinhou a atualidade da reflexão sobre a repressão salazarista e as marcas que deixou no tecido familiar e na vivência democrática portuguesa.
Uma obra sobre memória e feridas da ditadura
No livro, Marianela Valverde reúne depoimentos de familiares de opositores ao regime de Salazar e Caetano, centrando-se nas consequências da prisão, vigilância e perseguição política na vida quotidiana destas famílias. A autora explora não apenas o sofrimento direto, mas também as ruturas afetivas, o estigma social e o silêncio herdado por filhos e netos, convocando a memória como instrumento de cidadania e de consolidação da democracia.
O filme que prolonga o testemunho
A apresentação do livro foi acompanhada pela exibição de um filme concebido a partir da mesma investigação, que dá rosto e voz aos protagonistas desses testemunhos. A linguagem audiovisual reforça a dimensão emocional e pedagógica do projeto, aproximando públicos mais jovens de uma realidade histórica que muitas vezes permanece ausente do debate escolar e familiar.
Um contributo para pensar liberdade e democracia
A iniciativa inscreve-se num contexto mais amplo de reflexão sobre o passado autoritário português, num tempo em que se discutem a memória da censura, da prisão política e da resistência, bem como a forma como estas histórias chegam às novas gerações. Ao trazer para o centro do debate as famílias dos opositores, a obra de Marianela Valverde amplia o olhar sobre a ditadura, evidenciando que a repressão não atingiu apenas militantes e ativistas, mas um universo social muito mais vasto.

De que trata o livro «Os Impactos Da Ditadura Nas Famílias Dos Opositores Políticos`» apresentado na Biblioteca Municipal Vicente Campinas.
Resumo:
Aqui está um resumo estruturado do conteúdo transcrito, focado nas temáticas centrais abordadas na obra de Marianela Valverde, pronto para ser anexado à reportagem.
Resumo baseado na obra “Famílias de Presos Políticos” de Marianela Valverde
Este documento reúne testemunhos de filhos e familiares de opositores ao Estado Novo, quebrando um silêncio de décadas sobre as vítimas colaterais da ditadura portuguesa. A narrativa foca-se não nos presos políticos em si, mas nas “sombras” e no sofrimento daqueles que ficaram do lado de fora das grades.
1. O Trauma da Prisão e as Visitas
Os relatos descrevem a violência da invasão do espaço familiar pela PIDE, muitas vezes durante a noite ou à hora das refeições, marcando psicologicamente as crianças que assistiam à detenção dos pais por “figuras sinistras”.
A vida destas famílias passava a ser marcada pelo calendário das visitas às prisões de Caxias ou Peniche.
Estas viagens, muitas vezes longas e custosas, envolviam humilhações burocráticas, revistas minuciosas e o contacto frio através de parlatórios de vidro, onde o pai deixava de ser uma figura protetora para se tornar um estranho ou um homem a chorar.
2. Sobrevivência Económica e Solidariedade
Com a prisão do sustento da casa, as famílias enfrentavam dificuldades financeiras extremas, dependendo do trabalho redobrado das mães e, crucialmente, da solidariedade de vizinhos e desconhecidos. Relata-se a criação de redes de apoio comunitário (como a partilha de comida entre presos ou festas para angariar fundos para as famílias), fundamentais para mitigar a fome e a pobreza.
3. Estigma Social e Discriminação
Os filhos dos resistentes enfrentavam segregação ativa por parte de setores da sociedade e instituições conservadoras. Há relatos de discriminação por parte de clérigos da Igreja Católica, que expulsavam crianças da igreja ou recusavam bens alimentares por serem “filhos de comunistas”, e de professores que permitiam ou incitavam o bullying escolar.
4. Clandestinidade e Separação
A obra aborda a dura realidade das crianças que viveram na clandestinidade ou que nasceram nela: vidas sem raízes, mudanças constantes de casa, privação de escola e a proibição de brincar ou fazer barulho para não alertar vizinhos.
Em casos extremos, a prisão ou clandestinidade dos pais levava à desagregação familiar, com crianças entregues a avós, tios ou até institucionalizadas em asilos, onde muitas sofreram maus-tratos e abandono. Criou-se, muitas vezes, um abismo emocional entre pais e filhos devido à longa ausência.
5. O Papel das Mulheres
O documento presta homenagem às companheiras dos presos políticos. Descritas como a “retaguarda da resistência”, estas mulheres suportaram o peso da gestão familiar, a perseguição policial, o estigma social e a preservação da memória do pai ausente junto dos filhos, muitas vezes sacrificando a sua própria saúde mental.
6. Legado: Entre o Trauma e o Orgulho
Os “filhos da resistência” carregam hoje cicatrizes invisíveis, traumas e silêncios herdados, mas também um profundo orgulho na coragem dos seus pais. A obra conclui que a conexão com este passado doloroso é essencial para valorizar a liberdade conquistada e resistir a futuras ameaças.
./josé estêvão Cruz